Já foi há praticamente um mês, mas um show dessa magnitude perdura na memória por muito tempo. Começamos falando que mais uma vez Eduardo Lane, da Tumba, pegou sua banda e chamou um grande expoente do metal extremo para acompanhá-los em uma longa excursão pelo Brasil, parando em cidades fora do eixo Sul-Sudeste que tem pouco ou nenhum costume de receber atos assim. Falaremos do show em Fortaleza, que, embora já tenha recebido grandes nomes, tem ficado de fora de muitas turnês que não sobem o Brasil além de Minas Gerais ou Brasília.
A noite do metal da morte começa com a SYSYPHUS, capitaneada por Felipe Ferreira e apostando num Death Metal mais moderno, com influências de Black Metal e muita filosofia para apontar os absurdos da vivência humana, características presentes no significado de seu próprio nome e em seu álbum de estreia, o “Absurd”.
Em seguida vêm os “donos da casa”, a NERVOCHAOS. Incansáveis, Edu Lane e seus parceiros viajam por todo o Brasil com bandas do calibre da IMMOLATION na bagagem. E seu show é também uma aula de death metal e brutalidade com as já icônicas “Pazuzu is Here” (antecedida, claro, pelos dizeres “Deus não está aqui”), “Total Satan” e “To The Death”, algumas com refrão pegajoso, todas com peso descomunal. Cabe lembrar também “For Passion Not Fashion”, canção que traduz o underground em música e a cadenciada “Feast of Cain”. Um show rápido, eficaz, poderoso, para que o público que já lotava o Hard Noise pudesse “beber do cálice da besta e saudar a prostituta do diabo”.
Eis que chega a hora do IMMOLATION. A banda formada por Ross Dolan (baixo/vocal), Robert Vigna (guitarra/espetáculo), Steve Shalaty (bateria) e Alex Bouks (guitarra) é uma das mais respeitadas do Death Metal estadunidense. Por vezes confundida por alguns brasileiros com a INCANTATION, pela brutalidade de seu som e até pelos nomes parecidos, curiosamente o quarteto tocava então na mesma casa em que a banda conterrânea. Agora, não tinha como existir mais nenhuma dúvida. O som pode até ter mesmo certa semelhança, mas ver Robert Vigna no palco é um espetáculo à parte. Ele literalmente redefine o sentido de “air guitar” (e isso você só vai entender quando tiver também essa oportunidade – desculpe). Não só o guitarrista, careca, cara de mafioso, rouba a cena com seus trejeitos, “shredando” pra lá e para cá, como se estivesse usando a guitarra para estraçalhar a cabeça de um inimigo, como literalmente duela com o colega de seis cordas. E qual dos dois ganha a disputa? Nós. Principalmente quando empatam.
No fundo tudo é uma parceria para trazer pra gente um som denso, conflituoso, complexo, brutal e muito, muito bom.
Conosco o tempo inteiro hipnotizados, o quarteto começa sem pena com a novíssima “An Act of God”, “Distorting Light” e “Kingdom of Conspiracy”, como se visitando sua discografia em ordem decrescente de lançamento. “Obrigado por se juntar à gente. Obrigado por apoiar o metal. Primeira vez que tocamos na sua cidade. Preparamos um set com material novo, material velho”, agradece e avisa Dolan, se mostrando sempre, a despeito do peso de seu som, simpático a cada trinca de canções. Simpatia e humildade. E reverência. Reverência às bandas que tinham estado no mesmo palco naquela noite. “Quero ver vocês aplaudirem a SYSYPHUS, a NERVOCHAOS”. E, diretamente dirigindo-se a elas: “É uma honra dividir o palco com vocês”. Esse reconhecimento deveria ser norma, mas a gente sabe que é exceção. Sem estrelismo nenhum, Dolan aplaude Edu Lane, que também é o nome por trás da Tumba (produtora). “O Eduardo é o cara, é quem fez tudo”.
O passeio pela discografia, que a essa hora já trouxe sons como “A Glorious Epoch”, já não mais seguindo aquela ordem estabelecida no começo, chega a 1991, quando lançaram seu primeiro álbum cheio, com “Into Everlasting Fire”. Dolan escolhe aleatoriamente alguém da plateia, um sujeito para ser o personagem da noite, aponta para ele e se declara feliz por ele estar feliz. “Assim que eu gosto de ver. Eu gosto de ver o entusiasmo”. E entusiasmo é o que ele e seus três companheiros de death metal mais dão e mais recebem de volta do público de Fortaleza. Sem medo de falhar, podemos incluir Ross na lista de artistas mais “pai d’égua” que tocaram por aqui. E a IMMOLATION deu uma aula de como tocar DEATH METAL, com brutalidade, mas também com humildade, companheirismo, parceria e, principalmente, entusiasmo.
Agradecimentos:
Tumba Productions, pela atenção e credenciamento
Mago Chris Machado, pelas imagens que ilustram esta matéria