O discurso é quase sempre o mesmo: bandas de hair metal nos anos 90 mudaram o som por que mostraram maturidade musical, evolução e todo aquele blá blá blá tão falacioso e mentiroso quanto uma nota de 3 reais. A verdade é a seguinte: praticamente todas as bandas de hard rock modificaram a sua sonoridade ou “deram um tempo” na época do grunge. No primeiro caso, sob o pretexto de um tal “amadurecimento musical” algumas bandas modificaram sua sonoridade com o puro intuito de pagar algumas contas e amealhar alguns trocados. Lógico que tal artifício não era necessariamente uma novidade, visto que muitas bandas possuem fases diversas. Há casos em que supergrupos foram montados com a intenção de vender mais pegando carona no momento musical em que viviam, vide o caso do Asia, um grupo formado por gente do progressivo que assumiu contornos pop/aor para entrar de vez no mercado americano, como dito pelo próprio guitarrista Steve Howe. O maior problema é que nem sempre esses grupos passavam verdade em seu som, apesar do sucesso comercial alcançado.

Voltando às bandas de hair metal, nenhuma banda que ousou mudar seu estilo na época em que o grunge dominou as paradas, teve suas mudanças recebidas de bom grado, salvo talvez o Aerosmith com seu Nine Lives de 1997. O fatídico ano, propositalmente citado, é na verdade um ano considerado maldito para o hard rock e não é pra menos, já que o auge das mudanças sonoras da maioria de seus representantes ocorreu aqui.

É desse ano que vem o Bom Ou Bomba? dessa semana. Vamos falar do polêmico Shadowlife, do Dokken. Lançado em meio ao turbilhão grunge o disco conta com 13 faixas na versão americana e 15 na versão japonesa (as bônus How Many Lives e Deep Waters) e é o último registro de George Lynch como guitarrista da banda.

Mas vamos às faixas:

  • Puppet On A String – A faixa de abertura conta com riff forte e grave, porém o ritmo já dá o tom do que está por vir: uma vibe soturna, com vocalizações pseudomalignas, tentando criar uma atmosfera densa, que no fim só consegue soar como um Black Label Society sem testosterona.
  • Cracks In The Ground – Faixa com ritmo confuso, que mais parece um cruzamento do que viria a ser o hoje finado Velvet Revolver com o também finado Blind Melon. A estrofe é fraca, e o refrão, bem, até hoje é um desafio identificar onde está o refrão dessa coisa.
  • Sky Beneath My Feet – O comecinho à la Sheryl Crow já mostra que vai valer bem pouco a pena continuar a audição desse disco. Logo depois dessa introdução xexelenta, a coisa descamba pra algo parecido com um Pearl Jam rebaixado à segunda divisão (como se o Pearl Jam pudesse ficar pior do que já é).
  • Until I Know – A maior tristeza desse disco do Dokken é perceber que a bateria de Mick Brown, antes pulsante e cheia de vida, agora se arrasta como um mamute bêbado em canções como essa, exalando sentimentalismo barato, tristeza plástica e melancolia fabricada em pouco mais de 2 minutos de pura tortura sonora.
  • Hello – Com um riff que faria o Soundgarden ter orgasmos múltiplos (o que não quer dizer que seja bom), essa música parece um cartão de apresentação da nova fase em que a banda se encontrava, inclusive em seu título super criativo (contém ironia). O problema é que aqui a banda parece entregar um cartão de boas festas como se fosse um de pêsames, ou seja, cartão errado entregue na época errada a alguém que não se conhece direito. Ficou confuso? Pois é, eu também.
  • Convenience Store Messiah – Ao ouvirmos os primeiros acordes dessa balada o que vem à mente? Southern Rock? Folk? Red Hot Chili Peppers em sua fase pós Californication? Pouco importa, já que em todas as nuances apresentadas essa canção falha miseravelmente. A pretensão dessa canção é tão evidente que seria mais fácil te convencer que o Nirvana parece o Boston, de tão esquisita e falsa que soa.
  • I Feel – A música começa com a frase “I Feel Seeing No One Touching Something”, ou seja, algo como “ Eu Sinto, Não Vejo Ninguém Tocando Algo”, e talvez seja a frase mais verdadeira desse disco como um todo. Como o baixo de Jeff Pilson pode soar como um Jeff Ament anêmico e as guitarras de George Lynch, antes enérgicas e faiscantes, agora parecem ser tocadas por Kurt Cobain, tamanho desleixo com que as bases são apresentadas? A verdade é que até as bases do Kurt são mais verdadeiras, enérgicas e nervosas do que George apresentou aqui, pois até os timbres estão terrivelmente comprimidos e sem peso.
  • Here I Stand – Quer mais guitarras irritantes? Ouça isso aqui e tenha uma idéia do que seria um gato brigando com um guaxinim em cima de um quadro negro enquanto a Aracy da Toptherm anuncia o apocalipse. Cruzes, que troço horroroso.
  • Hard To Believe – Essa faz jus ao título, pois é muito difícil acreditar que uma banda capaz de compor verdadeiros hinos farofa como It’s Not Love, Breaking The Chains, So Many Tears e Dream Warriors, seja capaz de cometer uma atrocidade sonora como essa.
  • Sweet Life – Talvez o único riff que se salve do disco. O vocal lembra de longe o que o Dokken fazia em seus tempos áureos, a levada de bateria é coerente, o baixo está gorduroso como de costume, pena que as guitarras soam como a fase atual do Bon Jovi, com aqueles acordezinhos batidos como se o cara estivesse aprendendo a tocar guitarra. Enfim, uma daquelas flores pequenas que nascem no meio do lixo ou na beira do asfalto. Muito pouco pra uma banda desse nível.
  • Bitter Regret – Os violões do começo remetem ao White Lion e até mesmo ao Firehouse, mas não se enganem, pois é apenas fachada. O Dokken não prometeu muita coisa e entregou menos ainda.
  • I Don’t Mind – Quem aguenta esses riffs alternativos e essas vocalizações agressivas como um copo de leite desnatado? Se eu encontrasse Don Dokken por aí um dia, a única pergunta que eu faria a ele dobre essa música e consequentemente esse disco seria: Por quê? Quer saber? Eu não me importo (com trocadilho).
  • Until I Know (Slight Return) – Nada é tão ruim que não possa ser repetido, e é justamente isso que acontece aqui. Uma versão instrumental da quarta faixa do disco, onde George Lynch parece obstinado a provar que não desaprendeu a tocar. O problema é que até mesmo nesse instrumental onde o mesmo poderia brilhar e nos entupir de frases incendiárias, ele opta por bases descompromissadas, fraseados que mais parecem uma capivara passeando pelas cordas, numa tortura sonora onde parece até mesmo ter esquecido de afinar seu instrumento.
  • How Many Lives – A edição japonesa contou com 2 faixas bônus e essa é a primeira. Por que resolveram lançar isso? Não sei, sinceramente. Não faz falta, não é nem de longe relevante pra banda e pros fãs, ou seja, ninguém pediu mas eles fizeram.
  • Deep Waters – Instrumental inicia parecendo o Rush na fase Power Windows, mas novamente se trata de uma brincadeira de mau gosto, pois basta o vocal entrar e tudo desanda. O Dokken poderia ter tirado umas belas férias, mas preferiu lançar isso aqui.

Mas e aí, é Bom ou Bomba?

Como já devem ter percebido, esse disco se trata de uma bela BOMBA. Fontes não oficiais me contaram que esse disco foi usado pra torturar os guerrilheiros na faixa de Gaza, mas podem ser apenas rumores.

Um disco pretensioso, sem inspiração, feito de má vontade, soando péssimo em todos os sentidos até mesmo se a banda fosse grunge desde os primórdios. Não ouça essa bosta de jeito nenhum se você for fã os caras, sob pena de querer queimar as camisetas da banda após a audição. Como eu sei que vocês vão ficar curiosos vou deixar o link do Spotify aqui pra vocês escutarem, mas depois não digam que não avisei.