Em 8 de maio de 2023, o Brasil perdeu mais do que uma cantora: perdeu uma revolução ambulante chamada Rita Lee.

Dois anos se passaram desde que ela virou estrela em definitivo, e a falta que ela faz é do tamanho do talento e da ousadia que sempre carregou. Rita não era só uma artista — era um estado de espírito. Doce, debochada, corajosa, inventiva. Uma mulher que sempre disse o que pensava e cantava o que queria, do jeito que queria.

Rita Lee no final dos anos 60. Foto por Ivan Barresti / Conteúdo Estadão

Sua trajetória começou nos anos 1960, quando fundou Os Mutantes com Arnaldo Baptista e Sérgio Dias. Em meio à explosão da Tropicália, o trio foi a faísca psicodélica que incendiou os palcos e desafiou a caretice da época. A parceria com nomes como Gilberto Gil, Caetano Veloso e Tom Zé colocou Rita no centro de um movimento que queria — e conseguiu — chacoalhar a cultura brasileira.

Mas Rita queria liberdade. Quando ela foi “saída” dos Mutantes (fato esse que gerou um certo ressentimento na cantora), mas logo ela começou a trilhar uma carreira solo,  que foi ainda mais ousada. Ao lado de Roberto de Carvalho, seu grande amor e parceiro musical, lançou discos antológicos como Fruto Proibido, Rita Lee e Rita Lee & Roberto de Carvalho. Foi com eles que ela eternizou clássicos como Ovelha negra ,Mania de Você, Lança Perfume, Agora Só Falta Você, Doce Vampiro, entre tantos outros.

Capa do clássico Fruto Proibido

Ela cantava sobre sexo sem culpa, sobre liberdade sem freio, sobre sentimentos com ironia e verdade. Foi a primeira mulher a ocupar com protagonismo o espaço do rock no Brasil — e abriu a porta para todas que vieram depois.

Mas Rita não parou por aí. Ao longo das décadas, ela se reinventou, flertou com o pop, com a MPB, com a literatura e até com o vegetarianismo (foi ativista ferrenha da causa animal!). Vendeu mais de 55 milhões de discos e escreveu livros best-sellers, incluindo a autobiografia que escancarou sua história com a mesma honestidade crua com que sempre viveu.

Nos últimos anos de vida, Rita viveu de forma mais reclusa no sítio em que morava com Roberto, cercada de bichos, natureza e música.

Capa de sua Biografia

Em 2021, veio a notícia dura: um câncer no pulmão esquerdo. Ela enfrentou a doença com o mesmo espírito combativo de sempre — com coragem, bom humor e poesia. Em um de seus últimos registros públicos, posou de cabelo raspado e batom vermelho, com aquele olhar desafiador de quem nunca se deixou abater.

Mesmo afastada dos palcos, Rita nunca deixou de se comunicar. Suas redes sociais eram cheias de tiradas geniais, memórias e interações carinhosas com fãs. Em 2023, infelizmente, o câncer venceu. Mas só o corpo foi embora. A alma, a arte, a rebeldia — essas continuam.

Curiosidades sobre a “ Nossa Senhora dos Desajustados”?

Tem muitas:

– Foi chamada por Paul McCartney de “rainha do rock brasileiro” (e ele não erra!).
– Já foi presa durante a ditadura por porte de maconha — e usou a experiência como combustível criativo.
– Tocava diversos instrumentos, era fluente em inglês e tinha humor de sobra.
– Chegou a apresentar programas de TV, fez participação em novela e até dublou personagens animados.
– Vivia dizendo que, se existisse reencarnação, queria voltar como um bicho preguiça!

Hoje, dois anos depois de sua partida, a gente continua ouvindo suas músicas e sentindo que ela está por perto — como uma boa trilha sonora de tudo que é fora do padrão. Porque Rita não foi só uma cantora. Foi símbolo de liberdade, de criatividade sem censura, de autenticidade em tempos em que isso custava caro.

No fim das contas, como ela mesma dizia:
“O que eu quero é mais gozar a vida!”

E é isso que a “ Ovelha Negra” do Rock nacional nos ensinou: viver com intensidade, humor, coragem e sem medo de ser diferente.

TEXTO POR CINDY SEIDEL