Quarta-feira, 30 de julho de 2025 — Abertura sob tempestade e lama
A jornada do Wacken 2025 começou já sob o peso das nuvens carregadas. Diferente de outros anos em que a chuva despeja sua fúria antes do festival e dá trégua durante os dias de show, desta vez a água caiu de forma persistente desde o início, impedindo qualquer chance do terreno secar. Ao adentrar os portões, o público foi recebido não apenas pelos riffs, mas também pela lama que se tornaria símbolo desta edição.


Antes mesmo de pisarmos no “Holy Ground”, houve uma primeira novidade para a imprensa: a retirada das credenciais e o check-in foram feitos em um novo local, a cerca de cinco quilômetros do festival. O detalhe curioso é que esse espaço é, literalmente, um curral, com vacas pastando tranquilamente ao lado da fila de jornalistas, fotógrafos e produtores. Para nós da Headbangers Brasil, foi impossível não sorrir — a cena combinava perfeitamente com o espírito rústico e o logo bovino que representam o Wacken. Uma recepção inusitada, mas absolutamente adequada.
A abertura oficial trouxe aquela atmosfera tradicional de boas-vindas. Bandas como Apocalyptica e Beyond The Black aqueceram os primeiros headbangers, mas os dois momentos mais memoráveis da noite pertenceram a artistas que transformaram a lama em detalhe diante da música.


Primeiro, a união de Tarja Turunen e Marko Hietala no palco. O reencontro dos dois ex-companheiros de Nightwish foi emocionante e histórico — e suas escolhas musicais reforçaram esse impacto. Juntos, presentearam o público com uma combinação de faixas solo e clássicos de sua antiga banda. “Dark Star” trouxe a dramaticidade única de Tarja, “Dead Promises” mostrou o peso do dueto entre as vozes, e quando os acordes de “Wish I Had an Angel” ecoaram, a plateia inteira explodiu em coro, vivendo uma catarse coletiva que ficará guardada na memória de todos. Foi um espetáculo de nostalgia e intensidade, que uniu passado e presente em perfeita sintonia.

Logo depois, subindo no palco com garra, o Saltatio Mortis entregou uma performance verdadeiramente épica sob uma chuva torrencial. Raios cortavam o céu e a água caía sem piedade, mas a banda e o público se recusaram a ceder. Ao som de faixas como “Finsterwacht”, “Schwarzer Strand” e a contagiante “Der Himmel muss warten”, o que se viu foi um espetáculo de resistência e comunhão. Molhados até os ossos, fãs e músicos cantavam e dançavam como se o temporal fosse apenas mais um ingrediente do show — e talvez tenha sido mesmo. Foi lindo testemunhar como aquela tempestade transformou o momento em um verdadeiro ritual pagão, com música e energia superando todas as barreiras.

Mas a natureza ainda não havia terminado sua intervenção. Já na madrugada para quinta-feira, uma supercélula atingiu a região, trazendo relâmpagos e chuvas ainda mais intensas. Por razões de segurança, a organização tomou a difícil decisão de esvaziar parte do camping, orientando os fãs a buscarem abrigo em seus carros. O anúncio foi feito pelo sistema oficial do Wacken-Chat e, mesmo em meio à frustração inicial, a medida foi recebida com compreensão — afinal, no Wacken a palavra de ordem é sempre a união.
Nós da equipe da Headbangers Brasil, assim como diversos colegas da imprensa de todos os cantos do mundo, estávamos na tenda de imprensa dentro do Wacken United quando o alerta foi disparado. Por orientação da organização, permanecemos ali até o aviso ser retirado. A experiência foi, curiosamente, tranquila: todos se ajudavam, compartilhando informações, água, café e até capas de chuva. E talvez esse seja justamente o maior símbolo do Wacken United: um espaço que funciona como um pequeno festival dentro do festival, reunindo imprensa, artistas, convidados, alguns fãs dispostos a pagar um valor bastante elevado pela experiência (cuja receita é revertida para a fundação Wacken em projetos sociais) e outros profissionais que fazem o evento acontecer. Ali, o espírito de comunidade do metal fica ainda mais evidente, e o cuidado da organização com a imprensa e seus parceiros salta aos olhos.

Por volta das três da manhã, o alerta do serviço meteorológico foi suspenso e, aos poucos, a multidão retornou às tendas, já cobertas de lama mas também de histórias para contar. Assim se encerrava o primeiro dia de Wacken 2025: com música, chuva, e a certeza de que estávamos prestes a testemunhar uma das edições mais desafiadoras e memoráveis da história recente do festival.
TEXTO POR CINDY SEIDEL




