Olá, amigos! Biel Furlaneto na área, e hoje trago mais um bom ou bomba!

É delicioso pegar aquele album clássico e destrinchar né? Aquele lançamento com cheirinho de pão quentinho tambem é uma maravilha. Mas e aquele doce de jiló (sim, existe) que você vê a galera torcendo o nariz sem provar? Hoje a gente vai mastigar de boca aberta pra te dizer se dá pra degustar essa iguaria!

Obs. Eu detesto jiló. Mas disso a gente fala em outra coluna (ou não).

Esporadicamente, vamos pegar aquele disco crucificado pela maioria (até por quem não o ouviu direito, ou que só conhece de nome e já fala mal) e dedicar um tempo carinhoso para analisar se ele realmente é ruim ou apenas mal compreendido. As músicas serão avaliadas uma a uma com notas de 1 a 5 estrelas (acho o 0 um desrespeito com quem cria arte, então, pelo menos quando eu assinar a matéria, não vai ter).

Minha estreia no quadro foi com o tenebroso “Asshole”, album de Gene Simmons (Leia a resenha AQUI).

Foto: Reprodução Internet

Para um segundo ato, nada melhor que o álbum mais caro e mais demorado do planeta: Chinese Democracy, do Guns N’ Roses.

Axl disse no Rock in Rio 2001 que, no ano seguinte, estariam de volta com o novo álbum (que já era esperado a algum tempo), mas demorou nada menos que sete anos (!) para o disco finalmente ver a luz do dia.

Mas será que ele é realmente uma bomba? Vem comigo analisar faixa por faixa!

Chinese Democracy
O disco começa de maneira promissora, com uma pitada de industrial e longe do hard rock dos clássicos, mas ainda assim é uma música muito agradável. O solo é um show à parte. Axl ainda tem muita potência para gastar. 4 estrelas.

Shackler’s Revenge
Aqui as coisas começam a ficar de fato bizarras. Difícil imaginar aquele cara de bandana dos EUA fazendo uma espécie de tentativa de ser o Rob Zombie. O industrial tão criticado aqui passa do aceitável para algo que não combina com o Guns N’ Roses. O refrão até é legalzinho, mas não salva o contexto geral. 2 estrelas.

Better
Certamente uma das melhores músicas do disco. Desde o riff inicial, já se percebe que vai sair um som promissor. Pode ser considerada um pouco experimental, mas aqui você consegue enxergar as raízes da banda surgindo de alguma forma. Destaque para o vocal de Axl, que começa limpo, tem seu famoso drive no refrão e uma dose considerável de ódio após o solo de guitarra. 4,5 estrelas.

Street of Dreams
Para mim, a melhor música do álbum com folga. Quem gosta das baladas regadas a piano não tem do que reclamar aqui. Não, ela não possui o clima épico de November Rain ou Estranged, mas carrega melancolia e sentimentos especiais dentro da sua proposta. Uma letra devastadora composta por Axl, Dizzy Reed (tecladista) e Tommy Stinson (baixista). Essa música foi tocada em uma versão mais rock em anos anteriores com o nome de “The Blues”, mas a produção do álbum elevou-a a outro patamar. Tanto o solo carregadíssimo quanto a explosão final são de tirar o fôlego. 5 estrelas.

If the World
A megalomania do astro maior da banda começa a afetar o disco de maneira mais forte. Uma música que começa com guitarra flamenca não tem como ir longe. A canção é quase toda sintetizada, eletrônica. Algumas pitadas de soul music, rock alternativo e pouquíssimo destaque para o básico do rock. Até a voz dele ficou mais descaracterizada do que era na época. Realmente difícil. 1,5 estrelas.

There Was a Time
Procurando o que dizer sobre a música, pensei no termo “filho adolescente da November Rain“. Tem coral, orquestra, efeitos e camadas de guitarra que criam um clima épico. Mas as semelhanças param por aí. Enquanto a “mãe” é aquela estrela de cinema, a “filha” faz um trabalho honesto, mas nunca chegará aos pés da genitora. E claro, como todo adolescente, a música é um pouco problemática. Elementos mais “moderninhos” tornam a parte orquestrada praticamente uma ópera digital em muitos momentos. Ainda assim, tem muito valor, principalmente na segunda metade da faixa. 3.5 estrelas.

Catcher in the Rye
Inspirada no livro homônimo (O Apanhador no Campo de Centeio, no Brasil), é uma canção boa. Está longe de ser esquisita como algumas partes do álbum, assim como também está distante das melhores. Tem uma guitarra consistente acompanhando a música inteira, mas confesso que o “larara lararara lara” em excesso me incomoda um pouco. 3 estrelas.

Scraped
Quando começa o coral maluco, só penso em mudar de música. Quando passa o coral, só penso que deveria tê-la trocado antes mesmo do coral terminar. Aqui não há muito o que aproveitar. A paixão de Axl pelo Nine Inch Nails passou dos limites. 1 estrela.

Riad N’ the Bedouins
Mais uma tentativa de soar agressivo com pegada industrial, mas com riffs árabes e vocais distorcidos. Uma salada de ideias, difícil de digerir. Divide o posto de pior música do álbum com a anterior. 1 estrela.

Sorry
Conhecida como uma música escrita diretamente para Slash (informação que nunca foi confirmada nem negada). A letra mostra que, quando Axl está com raiva de alguém, essa pessoa está com sérios problemas. Sonoramente agradabilíssima, com um instrumental quase fúnebre, extremamente pesado e introspectivo. Axl canta com a voz mais grave, contida e resignada do que o habitual. Ele não grita, não rasga . Ele ressente. Curiosidade: o backing vocal dessa música é de Sebastian Bach, ex-Skid Row, que já disse em entrevista que Axl estava bem “ferido” emocionalmente na época e que essa faixa era uma das mais pessoais que ele já escreveu. 4,5 estrelas.

I.R.S.
Acho que essa é a faixa mais “meio do caminho” entre o Guns clássico e o Guns “mutante” da era Axl solo. O riff principal é grooveado, cheio de swing e distorção, lembrando algo que poderia ter saído da era Illusion… se tivesse passado por um processador digital. Às vezes, me passa a impressão de que tinha tudo para ser algo do tipo You Could Be Mine, mas foi tão carregada de overdubs, efeitos e camadas que acabou ficando exagerada demais. Seria lendária em outros tempos… às vezes, menos é mais. 2 estrelas.

Madagascar
Mais uma apresentada aos brasileiros no Rock in Rio 2001. Sem dúvidas, a música mais emocionalmente carregada do disco. Aqui, Axl canta com uma mistura de tristeza, desespero e dignidade. Sua voz está rouca, gasta, mas ainda expressiva. O meio, que mistura trechos do famoso discurso I Have a Dream, de Martin Luther King Jr., com sua própria voz conversando, soa um pouco esquisito — talvez mais um daqueles momentos em que “menos é mais”. Eu gosto, mas compreendo completamente quem a considera uma abominação. 3 estrelas.

This I Love
Axl, piano e só. Essa é a receita de uma das músicas mais incríveis já lançadas pela banda. A voz grave nos versos e rasgada no refrão. Penso que o vocalista estava no estúdio e falou pra todo mundo: “Pode ir todo mundo embora que agora eu vou mostrar como se faz”. Dessa vez, a modernidade dobrando as vozes no refrão acerta o tom. Mais para frente, a música vai ganhando corpo, com uma orquestra que apoia, mas não brilha mais que Axl (e nem conseguiria). Aos poucos, os elementos de rock entram: um riff, uma linha de baixo e, na sequência, um solo de arrepiar. No final, a “banda” volta pro estúdio e finaliza de forma impactante. Se essa inspiração tivesse se mantido durante todo o processo, esse álbum seria enorme. 5 estrelas.

Prostitute
Quem disse que não existe um Guns N’ Roses pop rock? Apesar de crescer um pouco no refrão e no final, não me parece muito diferente do que o Bon Jovi já fazia nos anos 2000 com o álbum Crush, por exemplo. É agradável, mas talvez seja tão descaracterizada quanto as bizarrices que vieram antes. Porém, não apanha tanto por ser mais “ouvível”. 2,5 estrelas.

Resumo final: BOOOOM!

 O álbum sofreu demais com o tempo e a pressão desde o começo. Passou tanta gente pela banda que eu sequer me atrevi a creditar os belíssimos solos, porque nada menos do que cinco guitarristas são creditados no álbum.

Axl quis provar que era enorme e inflou o álbum com um tamanho que certamente não precisava. É um álbum confuso, um pouco bizarro, é verdade, mas com momentos ótimos e outros ainda bons.

Se tivesse 10 faixas em vez de 14, e as quatro que saíssem fossem as menos inspiradas, talvez fosse mais bem aceito.

Talvez a única grande injustiça que eu refuto seja: “Isso não é o som do Guns N’ Roses”. Tá, beleza. Mas o som do Guns N’ Roses é o quê? Appetite for Destruction? Porque, se for o AFD a referência, então os Illusions também não são o som do Guns N’ Roses.

Tudo bem, não gostar do álbum — até porque ele não faz muita força pra ser amado também. Mas não dessa forma (na minha opinião, claro).

TEXTO POR GABRIEL FURLANETO