Fortaleza, a capital do Ceará, tornou-se palco de uma noite de pura destruição sonora com a realização de um show épico, trazido pela sempre fiel Underground Produções, com a Xaninho Discos, onde quatro bandas de death metal incendiaram o público sedento por riffs devastadores e vocais guturais. Em 15 de maio, a cidade testemunhou uma verdadeira celebração do underground, onde os amantes do gênero se uniram em uma jornada intensa e extrema.

O palco do Hard Noise foi tomado por uma atmosfera sombria e eletrizante, com iluminação completamente vermelha, a exemplo de shows do CANNIBAL CORPSE. A plateia, formada por fãs dedicados ao estilo, mostrava-se impaciente e ansiosa pelo início dos shows, demonstrando sua devoção ao som pesado e obscuro.

A primeira banda a subir ao palco foi a tempestade sonora chamada “Echoes of Death”, a prata da casa. Formada por Fernando (baixo), Italo Rodrigo (bateria), Camilo Neto (guitarra) e Jardel (guitarra e vocal), com sua pegada visceral e arranjos intrincados, o grupo não poupou energia e deu o pontapé inicial nessa noite de insanidade musical. A plateia rapidamente se entregou à sua performance avassaladora. Com dois membros da cultuada Brasil afora DAMN YOUTH despejou sobre o público um Death Metal sem trégua, sem espaço para nada além do lamento funeral. O show não trouxe apenas canções do álbum “…In the Cemetery”, mas também algumas novas, que estarão em um vindouro EP. O quarteto, semelhante aos lendários DISMEMBER, provou ser uma força imparável do death metal cearense, deixando uma trilha de destruição sônica em seu caminho e solidificando sua reputação como mestres da escuridão.

Em seguida, foi a vez da primeira visitante, a PODRIDÃO, trazendo seu gore (em inglês, apesar do nome em português da banda). A energia emitida pelos músicos era contagiante, e os fãs se entregavam ao mosh a cada acorde, formando um mar de corpos em movimento. O trio paulista estava em meio de uma turnê de 40 dias pelo Brasil e, naquele show (e nos três anteriores), recebia o apoio de peso do guitarrista Paulo Henrique, da local GSTRUDS. Sem firulas, sem solos, só a nojeira do chão de uma sala de autópsia, o AUTOPSY brasileiro mostrou muita potência. Só em uma das últimas canções finais introduziram um pouco de cadenciamento. Já estava dando pena da bateria, violentamente castigada por Repugnant Fat (Rafael Prado). Alguém deveria proibi-lo de tocar. Toda a comunicação da banda com o público era feita pelo guitarrista Rotten Flash (Ivi Kardec). A comunicação do baixista e vocalista Pinto Pútrido (Putrid Dick – Júnior de Andrade) era através de seus urros de além cripta.

E por falar em cripta, a co-headliner da noite, “CRYPTA“, deu espetáculo como personagem principal da festa. Não obstante a delicadeza feminina, trouxeram uma dose extra de poder. Com suas letras sombrias, riffs cortantes e muita, muita simpatia, o grupo formado por Fernanda Lira (graves e maldade), Luana Dametto (brutalidade e delicadeza), Tainá Bergamaschi (técnica e raiva) e Jéssica di Falchi (beleza e fúria) cativou a audiência, que se entregou completamente à intensidade de sua música. Nem mesmo uma falha no microfone de Fernanda, lá pela segunda música, fez com que o inferno que o Hard Noise se tornou esfriasse um grau sequer. Os vocais ferozes e a precisão técnica dos instrumentos transformaram o ambiente em uma verdadeira máquina de guerra sonora.

Aí ninguém ligou para se as meninas dançaram o tchan ou não (até porque isso não faz mesmo o menor sentido, né?). A única coisa que interessava era receber de braços abertos o Death Metal que as meninas prometeram.

“Essa próxima é dedicada a todas as mulheres que estão aqui. Ela fala sobre a causa da destruição da porra toda”, avisou Fernanda. “Vocês sabem de quem eu estou falando. A lição de casa está pronta”, reconheceu a vocalista ao notar que todos sabiam que “Kali” era a canção.

Depois, “vocês estão prontos pra mais rápida do setlist?”, ela perguntou. “Essa fala da bosta que o país ficou depois daquele que alguns chamam de presidente”.

“Sem anistia”, foi o grito repetido do público para receber “Starvation”. O show realmente foi curto. E, principalmente, pareceu curto, porque foi mesmo muito bom. Fernanda prometeu voltar a Fortaleza com um disco novo, agradeceu “por nos dar um porto seguro” (lembrando da ajuda dos fãs para pagar os prejuízos que tiveram com o motorhome, atingido por um furacão na turnê nos Estados Unidos” e explicou de que se trata “From the Ashes”, uma das canções mais pancada do disco. “Fala de morrer e renascer, morrer e renascer, morrer e renascer de novo. Até chegar onde  a gente quer”.

 

No calor sufocante da noite, a atmosfera se encheu de uma energia sombria e frenética quando a INCANTATION subiu ao palco. No entanto, curiosamente, havia menos bangers no ambiente do que no show da CRYPTA. Ok, era domingo, mas ainda era cedo. Mesmo assim, muita gente preferiu ir para casa mais cedo. Não estou dizendo que o Hard Noise ficou vago. Longe disso. Mas, realmente, um número que não pode ser desprezado de bangers realmente demonstrou estar ansioso apenas pelo show das meninas de São Paulo. Enfim, com uma agressividade brutal, “Carrion Prophecy” e “Pest Savagery”, dos veteranos INCANTATION, invadiram os tímpanos dos espectadores, transportando-os para um reino infernal de distorção e caos e de onde a única saída era o próprio inferno. Da frigideira para o fogo, cada acorde e cada batida era como uma facada direto no coração, impulsionada por uma ferocidade indomável. Os vocais guturais bem característicos do senhor John McEntee rasgaram o ar, evocando imagens de morte, blasfêmia e desespero, enquanto sua guitarra e a de Luke Shively teciam riffs monstruosos que pareciam dilacerar a própria realidade. Kyle Severn (bateria) e Chuck Sherwood (baixo) forneciam o suporte avassalador que aquele som pedia. A multidão, enlouquecida pela intensidade do som, se entregou a uma catarse coletiva, mergulhando em uma espiral de cabeças balançando e mosh pits violentos. Com sua longa trajetória no cenário do death metal, os veteranos não decepcionaram, desferindo um setlist composto por clássicos atemporais.

– Boa noite, Fortaleza.  É bom estar de volta depois de um tempo tão longo – saudou McEntee antes de mais um som, que, ao fim, foi ovacionado com o nome da banda sendo bradado repetidas vezes. E na parte mais rápida de “Deliverance of Horrific Prophecies” o mosh tomou conta novamente do Hard Noise. Mas sons rápidos não são característicos da INCANTATION. Seu som é mesmo um Death Metal congelando o sangue, ao mesmo tempo que o ferve.

McEntee não deixou de mencionar a CRYPTA. “Vocês devem estar orgulhosos”. E canções como “Lead to Desolation”, o clássico “The Ibex Moon”, e “Rites of The Locust” ajudaram a estourar gargantas, costas e ouvidos de cada um dos maníacos ali presentes. O que sai da boca de McEntee é ininteligível (faz parte do estilo da banda), mas tinha gente cantando a letra junto com ele.

No final dessa jornada sonora implacável, os fãs saíram exaustos, mas com sorrisos nos rostos, satisfeitos por terem testemunhado um evento que ficará gravado em suas memórias. As quatro bandas de death metal em Fortaleza não apenas mostraram sua paixão pelo gênero, mas também provaram que a cena underground da cidade está mais forte do que nunca.

Agradecimentos:

Underground Produções, pela atenção e credenciamento.

Chris Machado, pelas imagens que não me deixam mentir nesta matéria. Confira mais nas galerias abaixo.

Echoes of The Soul

Podridão

Crypta

Incantation