Que a internet está repleta de lugares encantados e creepypastas que te arrepiam para o bem ou para o mal, não há dúvidas, Setealém está aí que não me deixa mentir. Mas e aquele lugar onde o pensamento mais perverso que você tiver, passa a ser uma terça-feira normal? Aquele lugar onde o teu desejo mais secreto (ou até vergonhoso) possa ser uma característica interessante até. Pois é, bangers, apresento a vocês, SISTINAS. Não, não é uma página voltada à devoção do Danzig, embora essa música seja uma delícia. É o portal para os seus desejos realizados. Se um dia Bon Scott disse que Sin City tinha diamantes e degradação, SISTINAS diz que essa degradação é apenas um ponto de vista

Mas se você espera uma Basin tipo a de Frank Miller, esqueça. Sistinas tem uma brisa diferenciada, um vento inebriante que vicia e apavora simultaneamente. Te causa a sensação de perigo, a adrenalina corre teu corpo te preparando para correr, mas você só quer andar cada vez mais noite e cidade a dentro.

Fundada em 31 de maio de 2000 pelo auto entitulado LEWD, escritor paulista que escancara a perversidade humana como quem conta uma história pra dormir, num bate papo com o Headbangers Brasil ele abre o jogo sobre como a música foi importante (e é) para o nascimento e contrução de cada pavimento dessa cidade que não merece apenas a sua visita, mas com certeza a sua mudança pra lá. 

Cena do Filme Dracula de Bram Stoker que inspirou a criação de Sistinas. Foto: Reprodução Internet

Headbangers Brasil: Acho que essa é a pergunta mais feita na sua vida, mas onde fica Sistinas?

Lewd: (risos) Sistinas fica onde moram os desejos obscuros, os fetiches, o proibido e o desejável. Que é dentro de você.

HBr: Você diz em seus perfis nas redes sociais que escreve porque a vida não basta, essa foi a principal motivação para a concepção de um mundo paralelo, que aliás é uma alegoria perfeita da perversão humana, assim como Carroll fez em Alice Através do Espelho?

Lewd: Longe de querer me comparar ao Carroll, mas sim, desde a infância eu reescrevia finais de histórias, filmes e quadrinhos que eu não gostava. Daí para começar a escrever minhas próprias foi um caminho natural.

HBr: Você lembra se usou uma música específica como inspiração para a criação de Sistinas?

Lewd: Não, uma música específica não.

HBr: Aliás, a música homônima de Danzig faz algum sentido para essa cidade, além de dar seu nome?

Lewd: De “Sistinas” do Danzig eu peguei apenas o nome, achei sonoro o suficiente para batizar a cidade.

HBr: Você diria que Sistinas é uma cidade de corações solitários que procuram vida nos visitantes?

Lewd: Pode ser, a letra de Sistinas condiz com essa vibe que passo nos contos.

HBr: Com base na letra da música Sistinas, você concorda que o vampiro do conto Monjas, seria a descrição perfeita do que ela relata?

Lewd: Concordo, apesar dele não ter sido escrito de maneira intencional pra “bater” com a letra dela.

HBr: Você cita músicas em vários de seus contos: Labia Majora começa com Reckoning Day, do Megadeth, do álbum Youthtanasia, 1994, e a banda fictícia presente no conto, executa essa mesma música, aliás, com uma mística bem interessante. Qual a relação dessa música e de tantas outras na criação de seus contos?

Lewd: A música é uma coisa intrínseca em meu processo criativo, ela pode se manifestar de muitas formas: às vezes preciso de uma playlist específica pra me “colocar no clima” da cidade, mas nenhuma dessas músicas necessariamente entram de alguma maneira no conto. Acontece de nomes de músicas batizarem personagens e/ou locais. Por exemplo, “Umlahi“, das Medieval Babes virou o nome da minha sereia. “Aces High” é o nome do meu bar panorâmico, pois eu já o tinha “visto” na capa do Somewhere in Time, do Iron. As três primeiras faixas do álbum “Aégis“, do Theatre of Tragedy (um dos meus CDs favoritos) são nomes femininos, e quando tive que criar uma tríade essa escolha me pareceu óbvia: Cassandra, Lorelei e Angelique. São muitas – muitas MESMO – as citações e referências musicais em minha obra. 

HBr: Diversos livros foram adaptados pro cinema: O Exorcista, A Profecia, Matrix… Qual o seu conto ou compilado você acredita que seria um bom roteiro a se adaptar? Ou você é muito apegado ao seu “mundo de Sistinas” e acha que na verdade ele merece uma série, tipo Contos da Cripta, com uma personalidade introduzindo o que seria a história do dia?

Lewd: Bom, tempos atrás um produtor amigo meu sondou especificamente o conto “Baby sitter” pra quem sabe um dia virar longa em algum streaming. Na época ele tinha abertura na Netflix, mas imagino que não chegou a ninguém lá de dentro. Como escrevo contos, imagino que uma série seria melhor, mas não imagino nenhum host/apresentador não.

HBr: E por falar em compilados, você fez uma seleção de alguns de seus contos para o seu livro “Contos Perversos de Sistinas” de 2016. Eles foram organizados na sequência dos Sete Pecados Capitais, certo? Como você idealizou isso? E por que esse mote dos Sete Pecados, sendo que Sistinas trata 100% de um deles: luxúria?

Lewd: Esse livro foi lançado pela Universo dos Livros, então quando estive lá para negociar o editor me disse “livros de contos não são vendáveis” e me aconselhou a criar alguma maneira de ligar todos os contos. Analisando as obras semelhantes que existem por aí, como o Decameron e os Contos da Cantuária, percebi que precisava de um tema central. Enquanto eu selecionava os contos que entrariam no livro, também percebi que dava pra pinçar um “pecado” em alguns deles. A partir daí decidi que seriam demônios contando essas histórias, o que me permitiu também explorar melhor esses personagens todos. Então existe uma grande história acontecendo por trás de todos os contos narrados no livro.

Rascunho do livro junto com a edição de 2016 finalizada. Foto: Reprodução Instagram

HBr: Oscar Wilde disse uma vez que cada criação sua levava um traço de sua personalidade. Dorian Gray, por exemplo, era resultado de sua preocupação com o tempo que ele ainda tinha para fazer o quê queria, embora a Síndrome Dorian Grays Seja um fenômeno onde as pessoas se preocupam excessivamente com seu envelhecimento. Mas se você tivesse que listar alguns de seus protagonistas, qual seria o traço de sua personalidade que ele carregaria?

Lewd: Apesar de acreditar que sim, que quase todos meus personagens carregam traços meus, sinceramente não saberia dizer quais exatamente. Acho que essa prefiro deixar pra leitoras mais atentas tentarem descobrir.

HBr: Qual seria a música de sua vida?

Lewd: Essa sou corajoso pra cravar: Temple of Love do Sisters of Mercy.

HBr: Escrever por que a vida não basta. Quem te inspirou a escrever, ou o que te inspirou a escrever?

Lewd: Eu sempre escrevi, e na infância arriscava a desenhar junto. Queria fazer quadrinhos. “Quadradinhos”, no meu caso. Riscava em folhas de caderno, mas era um péssimo desenhista. Me lembro de algumas vezes desenhar filmes que assisti, mas dando finais que eu queria para eles. Depois veio a época das redações escolares, que eu sempre gostei. Certa vez descrevi um assalto a banco como se estivesse presente. Chocou a professora talvez – afinal a violência não era tão banalizada como hoje – mas ganhei boa nota com ela! Na adolescência tive contato com as primeiras HQs eróticas, a maioria material europeu, como Manara, Heavy Metal, etc. E daí em diante adicionei erotismo à minha escrita.

HBr: Machado de Assis descreveu as perversões da sociedade de sua época de forma irônica, com um humor feroz e ardiloso, mas com muito bom gosto. Descreve Capitu, uma de suas heroínas, como uma mulher de “olhos de ressaca, e de cigana oblíqua” que encanta e guarda tudo pra si, mas que apesar de suas qualidades, não era digna de confiança (segundo Bento, que tinha uma ideia fixa por seus chifres); já Brás Cubas, se pergunta “por que Virgília era tão linda, se coxa”. Dentro do seu padrão de escrita, que tipo de personagem teria um trunfo maior: alguém linda e manca, ou alguém com olhos indescritíveis?

Lewd: Ah, eu imagino que uma personagem com olhar diferenciado se destacaria em Sistinas.

HBr: Sei que é um exercício complicado para um escritor, mas vamos fazer um jogo. Me responda com a primeira palavra que te vier à mente!

Um livro: Fome de Viver, do Whitley Strieber

Um autor: Chuck Palahniuk

Nome proibido: acho que nenhum rs*

Melhor filme da vida: Drácula de Bram Stoker

Melhor Trilha Sonora do Cinema: O Corvo, de 1994

Se você tivesse que ouvir apenas uma música por toda a sua vida, seria: “Temple of love”, Sister of Mercy

Gosta de falar sobre: sexo, futebol e cultura pop

Gosta de fazer: namorar, consumir cultura pop no geral e dar rolê com minha filha

Palavra que te define: dualidade

HBr: Agora se você tivesse que mandar uma mensagem para os nossos leitores, que eu tenho certeza, depois de hoje, serão seus também, qual seria?

Lewd: A mensagem que deixo para os leitores do site Headbangers Brasil é que somos iguais: compartilhamos a mesma paixão pela música e, caso você também se interesse por lendas, mitologias, simbolismos, o quanto uma vampira conseguiria te sugar ou sobre o que aconteceria caso um lobisomem encontrasse uma parceira sexual compatível, venha conhecer minha egrégora em forma de site em www.sistinas.com.br

Assim como nós, Lewd mostrou sua natureza totalmente humana revelando o quanto Sisters of Mercy é marcante e importante em sua vida. Primordial a ponto de suas músicas permearem toda a construção do consciente e do inconsciente de Sistinas. Templo do Amor, um de seus contos clássicos, é inspirado no hino Temple of Love, do single homônimo de 1983 (que ainda tem Gimme Shelter no lado B, que é fantástica). Depois de 9 anos, em 1992, a banda regravou essa música com a cantora Ofra Haza e se tornou hit em toda a Europa.

Mas, assim como a vida é uma caixa de Pandora que às vezes sai alguma coisa boa, o Headbangers Brasil entrou em contato com Ben Christo, o atual guitarrista (e parte simpática) da banda e conversou um pouquinho sobre como a música deles pode significar para a vida de uma pessoa.

E com a palavra, a inspiração.

Foto: Reprodução Instagram

Headbangers Brasil: Você toca em uma das bandas mais expressivas – para o gênero – da história. Como você sente a importância e relevância disso?

Ben Christo: É incrível fazer parte de algo tão histórico assim. Quando eu comecei a tocar, Andrew (Eldritch) já fazia o que faz hoje, e muito bem. Então, subir no palco e sentir toda a paixão e devoção que os fãs tem é gratificante, mas também uma grande responsabilidade. Dá um pouco de medo de decepcionar de alguma forma, então você respira fundo e faz o seu melhor. As pessoas percebem e correspondem e tem sido assim desde que eu entrei.

HBr: Você tem alguma noção de como a sua música toca as pessoas? Eu mesma geralmente entro em transe…

Ben Christo: Puxa, obrigado. Os fãs do Sisters of Mercy são bem apaixonados, e eu percebo nos shows que aquelas pessoas esquecem tudo o que está fora daquele teatro. Só existe ali, nós e a música. Você sabe, todos temos nossos problemas, nossas questões, então se por duas horas eu sou capaz de ajudar aquelas pessoas a terem um momento melhor ou incrível, você sabe, é maravilhoso. Essa troca é perceptível, é uma energia quase palpável. Me sinto honrado por isso, por fazer parte disso.

HBr: Uma pesquisa do Spotify nomeou Temple of Love como a música mais importante da carreira do Sisters of Mercy. Você concorda com isso? 

Ben Christo: O que eu posso dizer? Ela é perfeita. E quando ela já era perfeita, Andrew mostrou que podia ser mais ainda e regravou. Não sei se é a mais importante, mas uma das mais. More também é muito aplaudida quando tocamos, Lucretia… Mas se os fãs dizem, você sabe, eu não digo o contrário. Andrew adora ela também.

HBr: Um escritor brasileiro, Lewd, criou uma cidade repleta de criaturas fantásticas, Sistinas. Essa cidade é descrita através de vários contos. Um deles é Templo do Amor, graças à sua música. Também existe uma linda personagem chamada Marian. Como você vê essa inspiração que você passou para os seus fãs?

Ben Christo: Você me mandou esse texto e eu achei incrível. Ele é instigante, envolvente… Quando li, você sabe eu pensei “wow, vou mostrar isso aqui pro Andrew!” Ele leu e gostou. Comentou que foi um jeito interessante de entender a música, já que ela pode ter uma leitura devastadora, assim como o texto desse escritor. Eu entrei no site, fiquei curioso para ler o resto, mas meu português é precário. Você poderia me mandar mais textos dele? Gosto de ler durante as turnês. E o que você disse sobre inspirar fãs, bom, é incrível. As músicas são da banda, anterior à minha entrada, mas você sabe, dei um pouco da minha identidade e as pessoas aceitaram bem, então é muito gratificante. 

HBr: E você teria alguma mensagem para o público do Headbangers Brasil?

Ben Christo: Amigos, eu adorei visitar vocês no ano passado, foi um show incrível. Espero voltarmos em breve. Acompanhem a banda pelas redes, entrem em contato, que sempre que eu consigo, respondo. Nos vemos por aí!

Agora banger, faz uma coisa: termina de ler essa matéria e corre viajar para Sistinas agora, porque se até Ben Christo ficou com um gostinho de “quero mais”, imagina a gente que é tudo cidadão comum?!

 SERVIÇO

O livro “Contos Perversos de Sistinas” está disponível na Amazon, então, se você quiser um pedacinho dessa cidade na sua estante, corre pra lá!

Texto por: Bel dos Anjos

Fotos Lewd: Reprodução Instagram

Fotos Ben Christo: Reprodução Instagram 

Agradecimentos a: Isabele Miranda