Não é fácil tocar rock no Brasil e se manter relevante, ainda mais se você toca heavy metal cantado em português. Mesmo com todas as dificuldades, existem bandas no Brasil que se tornaram lendárias, mesmo em uma época onde o rock nacional parecia ter medo de incluir peso, velocidade e distorções em sua música, preferindo flertar com a New Wave britânica ou o pop. É o caso do Azul Limão, que sob o comando de Marcos Dantas mantém acesa a chama do heavy metal, sem fazer concessões, cantando em português e sem tentar se adequar ao mercado internacional. A banda está na ativa há mais de 30 anos, e pode ser considerada vencedora, pois mesmo em meio a tanta falta de apoio, segue viva na memória dos saudosistas e angariando novos fãs. A banda irá se apresentar dia 12 de julho no Tênis Clube de Mesquita no Rio de Janeiro e nós conversamos com Marcos sobre o show e diversos outros assuntos, sempre com muito heavy metal no papo. Agora, é hora de colocar o som do Azul Limão pra rolar e ler essa entrevista, que é uma verdadeira pepita de ouro (ou de metal) para os bangers de plantão.

  • Como foi o início da banda?
  • MD – Foi em 1981 para tocar em festivais de colégios, mas a fase profissional iniciou em 1983.
  • Como era o processo de composição da banda no início e o que mudou em comparação à maneira de compor hoje em dia?
  • MD – Basicamente as músicas eram individuais e compostas no violão e apresentadas nos ensaios da banda quando todos faziam o arranjo conjuntamente. Hoje em dia o processo continua o mesmo, mas com a diferença das músicas serem apresentadas à Banda por meio de demos caseiras feitas no computador ou gravadas no smartphone. E também há mais parcerias quando um faz a letra e outro faz a música.
  • A maneira de trabalhar em estúdio também mudou bastante hoje em dia. Como equilibrar o uso da tecnologia sem deixar de soar vintage?

MD – Privilegiamos os sons orgânicos, ou seja, a bateria é gravada de forma acústica com microfones nas peças e no ambiente. As guitarras e baixo também são gravados com amplificadores valvulados devidamente microfonados. Apesar da possibilidade digital ilimitada de canais, procuramos também não usar muitos canais de gravação e ficar apenas nas dobras minimamente necessárias para dar dimensão ao som na mix.

  • O Azul Limão está sempre contando com bandas de abertura oriundas do underground. Seria essa uma forma de manter o estilo vivo?
  • MD – Sim. A cena se mantém viva por meio dos shows que as bandas fazem. O Rock não é um estilo de música popular em nosso país e o Heavy Metal menos ainda. Então, ter muitos shows acontecendo, mesmo que em pequenos espaços, faz a cena se manter viva.
  • Em 1986 a banda lançou Vingança, considerado um clássico do metal nacional. Ainda assim, além do Azul Limão, bandas como Inox, Salário Mínimo e Harppia, não conseguiram um grande apoio do mainstream. Na opinião de vocês, o que faltou para que o heavy metal nacional conseguisse o mesmo espaço de grupos mais populares como Barão Vermelho, Paralamas, entre outros.
  • MD – Como disse antes, o rock não está enraizado em nossa cultura popular como os estilos de música ligados às características culturais de cada região do Brasil como o forró, o samba, o axé, o baião etc. Na década de 80 o rock que tinha um apelo mais pop recebeu um grande investimento das grandes gravadoras, pois existia um público-alvo que consumia música estrangeira por meio das rádios FM que estavam em expansão na época. As guitarras distorcidas e o vocal gritado do rock pesado, heavy metal, não se adequavam ao padrão estético destas rádios e, por isto, as bandas de heavy metal brasileiras não receberam este investimento das grandes gravadoras, ficando à margem do chamado Brock, ficando no underground.
  • Mais de 25 anos se passaram quando o Azul Limão decidiu retomar as atividades e logo em seguida a banda teve de readequar sua maneira de trabalhar devido à pandemia. Como foi sobreviver ao mercado musical nesse período?
  • MD – Atualmente todos da banda têm seus day jobs, ou seja, a banda não é sua única fonte de renda. A Pandemia foi terrível para todos. Nesta época lançamos um CD (En Acción) gravado num show do final de 2019 e logo depois outro CD (Em Quarentena) gravado numa live no Youtube. Foi a maneira de manter a banda viva neste período.
  • A banda está prestes a realizar um show na baixada fluminense, na cidade de Mesquita, ao lado de Steewild e Hell Visions. O que os fãs podem esperar desse evento?
  • MD – Muita energia e pretendemos tocar muitas músicas dos anos 80 para que todos recordem esta época junto com o Azul Limão.
  • A primeira vista o nome Azul Limão não soa muito heavy metal e ao ouvir os discos da banda a surpresa é ainda maior. Por que escolher um nome tão inusitado?
  • MD – Quem sugeriu o nome foi um antigo baterista Fábio “Bebezão” a partir de uma citação numa tira de quadrinhos que ele tinha visto. O nome era provisório e nunca mais foi trocado. Agora virou história!
  • O Azul Limão, no disco Vingança, soa pesado, agressivo, flertando até mesmo com o Speed Metal ao passo que em Ordem e Progresso a banda soa um pouco mais melódico, sem abrir mão da velocidade. O que mudou, na opinião de vocês, em termos de sonoridade, entre o primeiro e o segundo disco?

MD – Interessante esta visão, pois, para a banda, o Ordem & Progresso soa como uma continuação do Vingança.

  • Que bandas chamam atenção no cenário atual?
  • MD – Vou passar minha opinião. Daqui do Rio fiquei muito impressionado com a banda Velho que não é do estilo de metal que normalmente ouço no meu dia-a-dia, mas que me impressionou muito pela qualidade da arte que eles produzem. Também do Rio, o Hatefulmurder me impressionou com seu metal moderno e de muito bom gosto. Dentro do estilo de rock que normalmente procuro escutar, a banda do sul do país Hurricanes me agradou muito aos ouvidos pela sonoridade que produzem e está entre as minhas preferidas atualmente na minha playlist diária.
  • Imortal soa atemporal, parecendo muito com a fase áurea da banda. Fazer um som remetendo às raízes é uma maneira de inspirar outras bandas e se manter fiel ao seu público?
  • MD – Sim. O Azul Limão tem uma marca registrada no seu som que naturalmente aparece em tudo que produz. Procuramos deixar isto fluir sem nos preocupar com comparações.
  • Quais as principais influências da banda?
  • MD – Posso falar das minhas influências. Minha inspiração vem das bandas que fizeram parte da minha adolescência nos anos 70, Slade, Kiss, Foghat, Rush, Uriah Heep etc. É claro que todo o ambiente do heavy metal britânico que acontecia no início dos anos 80 influenciou muito na hora de compor as músicas do Azul Limão. Bandas como Judas Priest, Iron Maiden e Motörhead, por exemplo, estão presentes como influência no estilo da banda.
  • Que conselhos dariam para quem deseja fazer heavy metal cantado em português no Brasil?
  • MD – A estrada é difícil, mas vale a pena! A vida é curta e se você gosta, mas gosta mesmo, então não perca tempo, faça enquanto é jovem porque depois a vida trará mais dificuldades e você se arrependerá se não tiver feito. Mesmo que não alcance tanta projeção, suas conquistas serão suas para sempre. Se optar por cantar em sua língua natal, o português terá uma conexão muito legal com seu público, muito melhor que cantando em inglês. O uso de inglês nas letras só vale a pena se você tiver uma aspiração de carreira internacional, que não é o caso do Azul Limão.
  • Deixe uma mensagem para seus fãs e para aqueles que ainda não conhecem o som de vocês.
  • MD – Curtam muito a vida e se for ao som do Azul Limão, melhor!