Todo profissional tem um tormento, ou um medo: para o engenheiro, deve ser errar uma conta e derrubar um prédio inteiro; para o piloto de avião, deve ser errar algum procedimento e derrubar o avião. O meu, como jornalista e fã da maior banda de heavy metal de todos os tempos, o Iron Maiden, era esse: noticiar a morte de algum deles. E infelizmente esse dia chegou. A besta descansou. Paul Di’Anno morreu neste sábado, 19, aos 66 anos, em decorrência do agravamento de seus problemas de saúde (embora, oficialmente não tenha sido nada confirmado, os familiares apenas noticiaram seu falecimento). Paul estava com sua família, em casa, em Salisbury, na Inglaterra.
Di’Anno nasceu Paul Andrews em Chingford, ao leste de Londres, em 17 de Maio de 1958 e assim como quase todos meninos dessa região, cresceu assistindo aos jogos do West Ham e trabalhando em fábricas locais. Mas essa vida não era para ele. A besta era grande demais para esse cotidiano tão simplório. Em 1978 entra para a promissora banda de New Wave of British Heavy Metal (NWOBHM), Iron Maiden e se mostra um ótimo frontman e compositor. Têm as mãos dele, pérolas como Remember Tomorrow e Running Free, ambas do début de 1980, o homônimo Iron Maiden, e Killers e Prodigal Son, da sequência, Killers, de 1981.
A carreira de Paul Di’Anno é formada de altos e baixos, como a maioria das estrelas que deixam suas bandas originais. Com ele não seria diferente. Se mostrou perdido, muitas vezes, mas nunca, em hipótese alguma, fazendo qualquer coisa que não transmitisse algo em sua voz, mesmo que fosse insatisfação. The Worlds First Iron Man, de 1997, é um ótimo exemplo disso: Di’Anno empresta sua voz ao clássico de James Brown, Living in America e à dançante Play the Funky Music, conhecida com o Wild Cherry Band, totalmente fora de seu lugar comum, mas um ótimo desempenho, com peso e Groove. Aliás, é desse álbum a linda Forever (não, não é a do Kiss), uma power ballad profunda e visceral.
Aliás, visceral é tudo que Paul Di’Anno sempre foi: viveu sua vida no limite, sabendo de suas consequências e não ligando a mínima para qualquer que fosse. Fez amizades e inimizades por onde passou. Conseguiu se redimir com fãs e até com seus antigos parceiros de banda. Uma história com erros e acertos, às vezes mais uns que outros. A verdade é que nosso herói não era nem um pouco galático, apenas humano, o que o tornava ainda mais incrível.
Falar dele no passado é um desafio, provavelmente um desafio que não vou conseguir cumprir, porque o legado dele fica. As incríveis apresentações, a discografia irretocável (muita atenção para o clássico Battlezione – Children of Madness, de 1987), o carisma ácido, com suas piadas de gosto duvidoso, Hammer inveterado e corinthiano de coração, esse homem, acima de tudo foi o Maiden mais próximo de nós, meros mortais. O único que viveu fora do Olimpo que nós criamos para todos eles. Não foi um santo, não foi impecável, mas foi o único capaz de arrepiar minha espinha e estremecer meu espírito com sua voz em Strange World, Remember Tomorrow ou ainda a declaração de amor em Charlotte the Harlot.
Passou pelo Brasil diversas vezes, com 100% de aproveitamento. Tocou covers, tocou músicas da Donzela, infelizmente não tocou suas canções próprias… Eu entendo, mas confesso que amaria ter assistido a um show apenas com músicas de sua carreira solo. Bom, fica pra próxima!
Rest in Power, legend!
Rest in Power, Beast… The Beast!
Texto por: Amanda Basso
Fotos por: Roberto Sant’anna e arquivo pessoal