Densa, perturbadora e necessária. A nova faixa que promove o disco ‘Outburst Desert’ do quarteto Fusage não economiza riffs e camadas de guitarras distorcidas numa cruzada contra o fascismo crescente nos últimos anos, principalmente no Brasil. A música é uma mensagem clara e direta ao pior governante que o país já elegeu.
Confira “Cerberus”:

Escrita em meados de 2018, a letra parece ter previsto a carnificina promovida pelo presidente, na época candidato. É um grito de indignação e luto, uma denúncia em um momento no qual não temos mais o direito de ficar em silêncio. Não se posicionar é concordar com o genocídio em curso.
Contando com participação de João Lemos (@molhonegro) tanto nas vozes dilacerantes clamando o fim do governo, quanto na guitarra que ambientaliza o tom do discurso, a faixa leva um nome da mitologia grega, Cerberus é o cão do inferno que guardava os portões do submundo. No refrão, um soco na cara profetiza a queda do “mito” seguindo as estrofes que ressoam como um exército de cidadãos prontos para derrubar o sistema podre instaurado.
Fusage está em processo de lançamento do segundo álbum Outburst Desert, produzido por Rodrigo Sanches e gravado no estúdio Rootsans (São Paulo/SP). Rodrigo que já trabalhou com nomes como Miranda, Cansei de Ser Sexy, Céu, Tom Zé, Nação Zumbi, Franz Ferdinand e Iggy Pop é um aliado de peso nessa nova fase da carreira. 
 
Enquanto o disco não sai, batemos um papo com a banda sobre sua trajetória, influências artísticas, processo de composição, planos futuros e outras curiosidades. Confira!
De onde surgiu o nome “Fusage”? 
O nome veio depois de muitas sugestões, mas o principal objetivo era representar o tipo de som que acabou fomentando o nascimento da banda, foi uma simples junção de FUZZ e AGE, na época o primeiro disco se chamaria Age of Fuzz, e acabamos batizando a banda como Fusage.
 
Como e quando a banda surgiu?
Oficialmente, se é que podemos dizer, a banda surgiu no fim de 2016. Já havia uma ideia bem clara do que queríamos fazer que era justamente começar uma banda que compusesse e tocasse músicas próprias, sair pra tocar e trabalhar sério pra encontrar nosso espaço no mercado musical. As primeiras composições surgiram antes mesmo da banda se formar, eu (Douglas) havia gravado umas demos junto com o produtor do estúdio e depois de algumas jams com dezenas de amigos músicos da cidade acabamos fechando um grupo de 4 pessoas que na época estavam afim de levar o projeto à sério. Depois dessa pré-produção, fomos nós 4, Douglas, Diogo, Christian e Luiz Miguel, que gravamos o primeiro disco e passamos um bom tempo divulgando esse material.
 
A banda segue promovendo seu último lançamento,  o single e clipe de “Cerberus”  . Como foi o processo de gravação do single e clipe?

O single faz parte do nosso próximo disco de inéditas Outburst Desert e foi gravado em São Paulo, no estúdio Rootsans do Rodrigo Sanches. Foi uma faixa especialmente difícil de gravar não só pela complexidade musical em si, mas pelo sentimento de revolta e indignação envolvido que nós procuramos canalizar por inteiro e da forma mais visceral que podíamos. A participação de João Lemos (Molho Negro) foi a cereja do bolo, o vocal e guitarras que ele gravou com certeza foram de encontro com a proposta desse som além da experiência de ver um grande artista em ação, o que pra nós foi uma escola.

Já a gravação do clipe foi feita em Maringá com uma equipe fantástica que inclui Gabriel Rodrigues (@chadvox) e Bulla Jr., um fotógrafo/diretor muito bem conceituado aqui na região. Desde o início a ideia era retratar esse período surreal e tenebroso que vivemos sob um desgoverno genocida, então resolvemos elucidar algumas notícias que marcaram o país e escancaram de forma precisa o quanto a gente sofre com esse messias da morte.

A faixa foi muito bem recebida nos sites de música especializada nacionais e internacionais . Como a banda está vendo esse feedback tão positivo do material lançado?
Não tem muito o que dizer né, a gente se sente extremamente grato e estamos doidos pra voltar pra estrada e poder fazer tudo isso ao vivo, encontrar a galera, levar a palavra adiante. É muito comum as pessoas não terem noção do tamanho do trabalho que é fazer uma produção bem feita, com todo zelo e carinho possível, mas cada comentário de apoio, cada pessoa que chega no inbox pra dizer que o som tá na playlist, etc, isso faz o nosso dia e nos incentiva a querer continuar. É uma sensação muito boa de que tudo isso é só o começo.
 
Suas músicas demonstram muita intensidade e entrega por parte da banda. Existe alguma composição que seja mais especial para vocês?  
Nesse caso tenho certeza que cada um vai citar uma música diferente ahhahah A gente tem um carinho enorme pelo disco todo, principalmente as faixas que vão sair antes, mas sempre tem aquele som que quando chega a hora de tocar você se anima mais ainda né. Por enquanto não vamos soltar o nome das músicas, mas seria legal saber do público que lê a entrevista, qual faixa é a preferida de vocês!
 
Quais as bandas e fontes artísticas que inspiram o som do Fusage?
Muito legal você ter citado também “fontes artísticas” porque a banda se alimenta de expressões e manifestações pra além da música. A gente já teve até Carl Sagan como fonte de inspiração pra compor Spaceman, o primeiro single do primeiro disco. Com certeza os gigantes do rock ‘n’ roll são cultuados por nós, não dá nem pra citar um ou dois né? De Black Sabbath passando por Kyuss até mesmo Royal Blood e Turnstile, a gente gosta demais de tudo no mundo do som pesado. Mas temos naturalmente buscado outras sonoridades também, acho importante estarmos em dia com o que tá tocando no mundo não como uma obrigação, mas pra se libertar das amarras do “você só pode ouvir isso!”. Por exemplo, todos da banda amam Dua Lipa, e ninguém espera uma banda de rock ser fã de divas pop assim, mas acho que não tem nada demais, todo mundo seria muito mais feliz curtindo todo tipo de som ao invés de nos fecharmos em bolhas e rótulos. 
 
Quais bandas nacionais vocês andam escutando?
Puxando a brasa pros amigos e amigas, escutamos Banda Cambaia, Afrodroid, Stolen Byrds, The Old Skull Guz, Aminoácido, 43duo, Zander, Ator Morto, Ember Brick, Elephantus… Tem tanta banda boa no Brasil que é injusto deixar de citar mais uma centena, mas é isso!
 
Podemos esperar  mais material inédito em breve?
Sim! Tem lançamento DUPLO de 2 singles do disco novo ao vivo no Festival Bananada BR, a versão digital do fest que é referência no Brasil todo. Dia 21 de novembro na twitch do @festivalbananada 19h!
 
Como vocês veem o impacto da pandemia e do desgoverno brasileiro em relação à cultura nacional?

É como se a gente estivesse afundado na merda e alguém descarregasse mais um caminhão de merda em cima do brasileiro. É difícil explicar, mas acho que nesses momentos da história é que mais precisamos de uma análise racional da coisa pra encontrar forças e soluções e não se perder num mar de desavenças e reclamações. É claro que ninguém aguenta mais, é óbvio que esse senhor ocupando a presidência é um dos maiores bandidos que já ameaçou a frágil democracia brasileira. Mas nós temos hoje uma clara noção, um diagnóstico da escória que apoia toda essa treva que abomina o país. E com esse conhecimento a gente precisa agir, tomar as ações necessárias pra evitar que o pior aconteça novamente.

Pegue por exemplo a nossa campanha de vacinação. Por que o Brasil tem um relativo sucesso em relação a países como a Rússia, Ucrânia e o próprio Estados Unidos? Porque nós tivemos campanhas de conscientização por décadas, criou-se uma cultura da vacinação e ainda bem que isso vem garantindo que a grande maioria das pessoas tome as doses, apesar de haver uma minúscula e patética parcela de negacionistas. Então eu acredito que a conscientização, o investimento na educação e cultura a longo prazo é a melhor saída pra evitarmos tanta glamorização da burrice e da ignorância, tanto culto ao ódio e mentira. O país sofre desmontes e a gente sente vontade de vomitar só de ver bandeiras do Brasil pedindo por intervenção militar nas sacadas da classe média, mas não temos pra onde fugir, a gente precisa se vacinar, se unir e fomentar a cultura de todas as formas possíveis, porque essa é a única salvação.