Todos os anos, o começo do mês de abril traz uma coincidência bastante trágica para o mundo rock, principalmente para a cena grunge, movimento de maior impacto dentro do estilo nos anos 90. Dia 5 de abril marca a perda de dois dos maiores nomes que surgiram da cena provinda de Seattle, os vocalistas Kurt Cobain, do Nirvana e Layne Staley do Alice in Chains, um morto em 94 e o outro em 2002. Mas antes de falarmos um pouco sobre esses dois, há ainda mais um fato que merece ressalva no mesmo mês, pois dia 4 de abril é o aniversário do também falecido Mike Starr, primeiro baixista do Alice in Chains, que fez a sua última apresentação junto a banda aqui no Brasil no Hollywood Rock em 93, e na ocasião, Starr já sabia que seria desligado de sua posição e como relatado no livro “Alice in Chains – A História Não Revelada“, nas últimas canções do show, o baixista as executou com lágrimas nos olhos ao pensar que ali seriam seus últimos momentos como membro do Alice in Chains, onde ele já estava ainda nos primórdios. Mike veio a falecer em 2011, vítima de uma overdose de remédios em meio à planos de voltar a cena musical onde começava a planejar um novo projeto com o ex vocalista do Days of the New, Travis Meek.
A cena grunge começou a ganhar seus maiores contornos no ano de 91, com o disco “Facelift” do Alice in Chains, sendo o primeiro exemplar do movimento à ganhar disco de ouro e ter certificação da RIAA pela dupla platina, no mesmo ano em que os também ótimos “Badmotorfinger” do Soundgarden e “Ten” do Pearl Jam também ganhavam a luz, trazendo o mega hit, “Man in the Box” que ganhou um vídeo pensado pelo próprio Layne Staley onde queria bebês de olhos costurados, mas no fim, ganhando uma versão um pouco mais leve porém, ainda fazendo jus aquela cena com a personificação da morte no vídeo. Em 92, o grunge ganhava o mundo inteiro com o lançamento de “Nevermind“, do Nirvana e “Smells Like Teen Spirit” tocando a cada meia hora nas rádios e seu clipe sendo martelado na MTV. As camisetas xadrez viraram artigo de moda e o estilo desgrenhado ganhava até conotações no calor escaldante do Brasil.
Nossas duas figuras centrais tem como coincidências não só a data de suas mortes, mas a própria vida. Não é segredo algum para qualquer um que tenha tido o mínimo de contato com algum dos dois, ou até que somente ouviram falar de seus nomes em algum momento que desde a infância, se tratavam de garotos que não se encaixavam bem nesse mundo, viam as coisas de uma forma bastante particulares, vindo de lares que se desfizeram muito cedo e nesse mesmo tempo tiveram que lidar com as separações de pais sem entender muito bem do que isso se tratava e tendo como escape, ouvir música e também o contato com as drogas que fizeram parte da curta caminhada de ambos e acabaram por se tornarem maiores do que os seus talentos. Mas antes disso, eles tinham sua forma de colocar isso para fora e mostrar ao mundo as almas atormentadas que eram e desenharem para si próprios um mundo onde por alguns instantes eles não eram esses caras que não se viam em um plano comum, ambos se viam libertos dessa pesada tarefa de estarem por aqui com seus próprios demônios e os expurgando em forma de canções, assim como Schopenhauer aborda no livro “O Mundo Como Representação“.
Kurt e Layne não eram amigos próximos, mas ambos se respeitavam e sempre mantiveram uma postura neutra em relação ao outro, sem ataques ou alguma demonstração de rivalidade entre suas bandas, tendo um contato esporádico inclusive no citado Hollywood Rock aqui no Brasil, onde se juntaram e arquitetaram planos para interesse mútuos. Mas o que realmente os aproxima é a forma como esses dois se tornaram ícones, como havia sempre o flerte com a morte e o lado sombrio do ser humano e também de como deram suporte através da música para um geração toda que se identificaram com aqueles versos e que até hoje os carrega e sempre fazem do dia 5 de abril uma data que traz a dolorosa lembrança das suas precoces partidas onde ainda tinham muito à oferecer, mas que de certa forma, foi o alivio que sentiram naquele momento, mesmo longe da ideia de se romantizar a morte nem muito menos banalizar o suicídio, seja ele direto ou indireto.
Mais um 5 de abril, mais uma vez a triste lembrança, mas exaltando os artistas que foram e principalmente a sua obra, então que “Down in a Hole” e “Heart-Shaped Box” explodam nos fones na data de hoje, pois mesmo em seus tons particulares, essa era a forma deles nos alegrarem e a si próprios.