Biografia: Sepultura – Chaos A.D. (1993)

“Combinando as referências musicais dos fãs de todo o mundo”

Nota: 4/5.
Banda que dispensa apresentações. De toda forma, para iniciar uma conversa, é preciso de mote e, neste caso, começo admitindo que este foi um dos discos que mais ouvi na minha vida inteira. Assim, para falar sobre “Chaos”, preciso de um exercício, o de tentar deixar de lado os preconceitos adquiridos ao longo do tempo, depois de tantos desgastes envolvendo o grupo antes e depois da saída do seu líder e a principal figura por trás da “mudança” de som da banda.

 

Arise foi minha primeira experiência com a música extrema e, confesso, não sabia me situar em relação às guitarras ultra pesadas, à bateria agressiva e aos vocais guturais de Max. Mas em Chaos A.D., apenas um pouco mais experiente, já havia estabelecido identificação com o metal mais brutal e, musicalmente, me via representado no mundo pelo Sepultura.

Se até Arise, o grupo apenas copiava o som das bandas americanas, em Chaos A.D. bradava ao mundo que o metal poderia incorporar elementos musicais “nativos” de qualquer lugar do planeta. Parece que instintivamente se apropriaram de uma identidade, a partir da qual construíram a sua. E, ironicamente, esse olhar voltado para os sons da sua terra natal coincidiu com a mudança do Brasil para a cidade de Phoenix / Arizona (EUA).

Chaos A.D., apresenta um grupo homogêneo, mas criativamente aguçado. Nele, há músicas para todos os gostos e estilos. Pode-se dizer que, em canções como Refuse / Resist e Territory, o sangue latino parece haver catalizado a agressividade sonora do grupo, que estava enfurecido com o sistema. Mas, no exemplo mais flagrante da nova atitude, a banda compõe uma peça instrumental que seria o ápice das performances ao vivo, a acústica Kaiowas, que se mostra através de violões quase medievais aliados a tambores pesados (um tributo ao povo Guarani-Kaiowá, que cometeu suicídio em massa como resposta à incursão do governo brasileiro em suas terras). “Chaos” é caracterizado por ritmos significativamente mais lentos, estruturas mais diretas e percussões que assinalam uma mudança drástica na parte instrumental. Da mesma forma, só que, pelo inverso, o disco também dedica espaço para momentos hardcore (Manifest), punk (Biotech Is Godzilla) e industrial (Propaganda) que marcam outra mudança, a de perspectiva lírica.

A escolha de Andy Wallace como produtor do disco provou-se certa. Ele optou por capturar a energia da banda tocando ao vivo no estúdio, ao invés do método tradicional em que as músicas são gravadas em camadas e depois submetidas a sucessivos overdubs. O resultado é o álbum mais cru e com maior senso de urgência feito pelo grupo até aquele momento.

Provavelmente, os caras pensaram em fazer algo que chamasse a atenção dos gringos, mas o fato é que acabaram por impressionar a muito mais gente fora da América do Norte e, não apenas por utilizar elementos da música brasileira, mas principalmente, pela forma como combinaram as referências musicais dos fãs de todos os lugares do mundo.

> Texto originalmente publicado no blog Esteriltipo.