O que temos aqui é o refinamento de uma brincadeira que começou no Facebook. Evoluiu e acabou virando um relato pessoal de experiências e memórias do nosso colaborador com a música pesada desde o ano de 1991, quando deu os primeiros passos firmes no mundo do Rock/Metal. De acordo com o autor, o apanhado que ora apresenta é uma amostra consistente de suas preferências musicais e compreendem os períodos de quando começou a gostar de rock até o momento em que se assumiu como headbanger. Os discos estão classificados por ordem de fatos:
O ZERØ surgiu nos anos 80, uma época super presente na minha vida. Nela, ocorreram as primeiras descobertas da adolescência e as primeiras frustrações amorosas, mas, sobretudo, simboliza a passagem para a fase mais importante da minha vida. Foi ali que decidi quem eu queria ser e o que poderia fazer num mundo onde as grandes possibilidades já pareciam negadas. Naquela época o Rock Brasil já devia ter superado sua infância e estava tentando ser levado mais á sério. Algumas bandas eram marcadas por um lirismo insipiente, justamente o caso do Zero. Apesar de tudo, era um período romântico e esse lirismo juvenil durante algum tempo foi o bastante pra me ajudar a entender o mundo e minha forma de interagir com ele. Carne Humana e suas letras sobre desilusão, melancolia e filosofia cobriram lacunas existenciais que mais tarde vi preenchidas pelo Heavy Metal.
Apetite for Destruction foi indispensável pra que viesse a gostar de Rock/Metal. Digamos que ele abriu a porta para as coisas mais pesadas. Era a época da rebeldia juvenil e a música do Guns ‘N’ Roses me representava em número, gênero e grau. Estava começando o ensino médio e minha vida parecia de cabeça pra baixo. Mas apenas parecia. Na prática eu tinha pouco com que me preocupar! Mas foi ali que conheci gente que pensava igual a mim. Amigos que queriam algo, mas não sabiam o que, nem muito menos o que fazer pra conseguir. Era o momento da identificação, do desejo de pertencer a um grupo. E eu até conseguia, mas ainda parecia faltar algo. Na falta de uma coisa concreta, o Rock veio para preencher esse espaço. Uma coisa que era pra ser apenas uma forma de sublimar as angústias e as frustrações, mas com a qual estabeleci verdadeira identidade.
Com este disco tomei conhecimento oficialmente do caos que reinava no mundo e a música ali contida era uma forma de expressão com a qual poderia suportar a impotência diante do todo impositivo. Wendy O. Williams foi uma das primeiras artistas no mundo a fundir o sentimento punk com a fúria do metal. Após o encerramento das atividades do seu grupo, o Plasmatics, ela decidiu seguir carreira solo e Kommander of Kaos é seu segundo trabalho. O álbum foi gravado em 1984, mas só foi lançado dois anos depois. […] O fato é que, por curiosidade, ouvi o disco muitas vezes e ele começou a fazer sentido pra mim. Então, depois de compreender o que havia por trás daquela raiva toda, passei a relacionar as coisas e a constituir opiniões próprias. Wendy sempre foi considerada uma desajustada social, mas na verdade, ela enxergava os discursos por trás dos fatos e preferia não se adequar a uma sociedade doente. Embora as letras não tenham cunho social, refletem sua aversão pelas regras e o desejo de ser aceita tal como era. E isso fica claro no discurso que introduz a faixa Ain’t None of Your Business (Gene Simmons). Outros destaques são: Hoy Hey (Live to Rock), Party e Bad Girl. Sem dúvida, o trabalho definitivo de uma artista considerada louca, mas certamente, autêntica.
Não Sou fã da banda, mas esse disco tem uma boa razão para figurar nesta lista: ele contém a essência do primeiro show de heavy metal que tive a oportunidade de presenciar. O ano era 1993 e apesar de já haver uma movimentação no cenário local, não era ainda algo que pudéssemos chamar de cena metálica ou metaleira (como muitos preferem). Esse show veio para quebrar o marasmo no qual viviam os roqueiros da cidade e acabou sendo uma grata surpresa. Na ocasião estava acompanhado dos amigos Jakson Costa, Radnay Abreu, Fábio e mais alguém cujo nome não lembro. A abertura do show ficou por conta das bandas Darkside (Fortaleza/CE) e Deadly Fate (Natal/RN). Talvez eu preferisse ostentar outro show/outra banda como minha primeira experiência de performance ao vivo, mas era o que tinha para o momento e, Angels Cry simboliza o meu batismo no mundo do Heavy Metal.
Este foi o primeiro disco que tive a oportunidade de adquirir com meu próprio dinheiro. Costumava visitar um sebo cujo nome era Museu do Disco, no centro de Fortaleza. O estabelecimento ficava num dos muitos guetos da boemia fortalezense. Numa dessas ocasiões, achei esse disco num emaranhado onde também havia Simon & Garfunkel e Maddona. Naquela época, a maioria do mitos sobre a figura de Ozzy eram muito vivos. Principalmente as histórias sobre arrancar a cabeça de um morcego com os dentes, praticar rituais de magia negra e o de ter influenciado no suicídio de um jovem “roqueiro”. Na verdade, as pessoas temiam a música de Ozzy Osbourne e isso só aguçava a minha curiosidade. Desses mitos, surgiram vários apelidos, entre eles, “Madman” e “Príncipe Das Trevas”. Comprei-o sem pestanejar! Apesar da capa “horripilante”, a música contida nesse disco não bota medo em ninguém. É Rock ‘N’ Roll puro e simples. Ou melhor: rock do bom! Embora muitos subestimem esse disco, musicalmente é um dos melhores do artista. Além de ótimas composições, marca a estreia do guitarrista Zack Wilde. No Rest For The Wicked é Ozzy em essência.
Com esse disco o Metallica declarava ao mundo que o Heavy Metal era legal. Não importava sua classe, sua cor e nem suas preferências musicais, você poderia ser/fazer o que quisesse e ainda assim gostar de Metal. Os comandantes da indústria musical elegeram a banda como núcleo de uma estratégia em nível mundial, e com a ajuda da MTV, venderam-na para todo um mundo em processo de globalização. Dessa forma, o Metallica, tal como outros anteriormente a ele, era a bola da vez. E eles se saíram muitíssimo bem no papel de heróis da música Heavy Metal moderna. Fatalmente, a banda tornou-se embaixatriz do “estilo americano” para o mundo. E o grupo foi tão competente na representação do seu papel que não deu mais espaço para que outros pudessem também ser a bola da vez. De toda forma, o Black Album é uma obra tão cheia de atributos que a crítica parece vazia. Parece, mas é necessária. Diria mesmo que se trata de uma poderosa peça de marketing pensada com o propósito inevitável de vender, vender e vender. Apesar de tudo, para o bem ou para o mal, fez a diferença na vida muita gente, inclusive na deste que humildemente escreve.
Concomitantemente ao Black Album, Arise do Sepultura foi um dos discos mais ouvidos na minha fase de “metaleiro” inexperiente. Aquela altura eu não dava a mínima para as bandas nacionais, exceto o Sepultura. Esse disco pegou a muitos de surpresa com o seu sucesso estrondoso. Um disco que foi chamado por boa parte da empresa (não) especializada de esporro sonoro violento. Tudo bem! Posso concordar! Mas esse esporro sonoro vendeu milhões de copias pelo mundo e não pôde ser ignorado. Era o quarto full length, mas apenas o segundo da banda a ser lançado por uma gravadora internacional. Os caras tinham sangue nos olhos, a mesma vontade que todo brasileiro tinha/tem de se sentir representado. E era isso que tornava o Sepultura, uma banda especial. Eles representavam a nós brasileiros no mundo. Mas não apenas nós, a todos os fãs de metal oriundo de países de terceiro mundo (expressão em voga na época). Nesse sentido parecia natural que eu fizesse vista grossa para todas as outras grandes bandas no cenário nacional, mas achasse o Sepultura o máximo.
Em 1993 eu passei uma temporada de três meses em Sampa. Esta viagem mudou minha vida no que diz respeito a minha paixão pelo metal. Um mundo de descobertas e vontade de participar desse universo de alguma forma. O disco em questão (juntamente com Show No Mercy, do SLAYER) foi uma das bandas que mais ouvi em minha estada na Terra Da Garoa, por isso, quase todas as lembranças relativas àquela viagem estão associadas à Souls Of Black – especialmente. Foi através desse álbum que eu tomei conhecimento da música da banda. Então voltei no tempo para ouvir os anteriores. Testament é um dos fundadores do movimento chamado de Bay Area Thrash Metal, que deu visibilidade a uma enxurrada de bandas originais da Baía de São Francisco, no estado da Califórnia (Heathen, Vio-lence, Forbidden, Death Angel e outros). Eu só vim conhecer em 93, mas desde então, sou um grande fã. E na minha humilde opinião, é a melhor banda de Thrash Metal da atualidade.
Desde o início, o Slayer sempre dominou a técnica de fundir suas influências do Punk com as do Metal e com isso criou um estilo único. Também conta o fato de que é uma das poucas bandas cujo estilo permaneceu praticamente inalterado ao longo dos anos, assim como sua popularidade. Mesmo havendo se aposentado dos palcos, eles ainda reinam absolutos entre os discípulos da música extrema. Show no Mercy é um disco em que os elementos do punk fluem de uma forma natural e espontânea. A música é cruel e cheia de energia. A fúria contida nesse material é palpável e os músicos tinham muito tesão pelo que faziam. Aqui é possível perceber a mesma animosidade que o Venom demonstrou em Welcome to Hell (1981). Só que, melhor produzido e muito mais agressivo. Eles preferiam riffs em ritmo acelerado e agudos vocais. Embora o Venom tenha lançado as bases do estilo, é por causa de bandas como Slayer (e dos outros três grandes) que o Thrash Metal ganhou notoriedade no mundo inteiro.
Extreme Aggression é para mim, definitivamente, o melhor disco do Kreator de todos os tempos. O riffing é variado, mas extremamente preciso, as composições são curtas e objetivas, a sonoridade é lindamente agressiva. Petrozza vocaliza cada frase como se nunca mais fosse ter a chance de fazê-lo novamente. A bateria de Reil é brutalmente dinâmica e as guitarras corroem os ouvidos como uma broca de dentista super precisa. Outra coisa importante sobre esse disco é que a banda progrediu sem sacrificar aquilo que lhe era mais peculiar, a rebeldia juvenil. Note-se ainda que houve uma mudança de atitude em relação aos trabalhos anteriores. A transição não foi gradual, mas é absolutamente perfeita. Com este disco, a banda se impôs literalmente no grito, mas de forma absolutamente convincente. Não tenho medo de afirmar que este é o melhor e mais brutal álbum do kreator em toda a sua história.
> Texto originalmente publicado no blog Esteriltipo.
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