O divisor de águas para Coverdale.
Os dias estão passando e nossos desafios continuam aumentando. Pois não é só esse terrível vírus que enfrentamos. Existem muitas outras coisas envolvidas, mas acima de qualquer dificuldade, procure cuidar bem de sua família. Vamos continuar crendo que dias melhores estão por vir. Agora é a nossa hora para falar de um pouco de música.
Como vocês já se acostumaram, à ideia aqui é propor alguma coisa para que você ocupe um tempinho do seu dia conhecendo algumas curiosidades e o mais importante, preenchendo um pedaço do seu tempo com uma boa dose de música pesada. E a dica de hoje é o álbum do Whitesnake, Slide It In.
“Slide It In” é o sexto álbum de estúdio da banda britânica de hard rock Whitesnake, lançado em 1984. Foi o primeiro trabalho do Whitesnake pela gravadora Geffen Records nos EUA, sendo que o disco foi totalmente remixado por essa ocasião e por esse motivo, existem duas edições bem distintas do mesmo álbum, cada uma com suas próprias qualidades únicas.
As gravações de “Slide It In” começaram em 1983 no Musicland Studios em Munique, Alemanha, com o produtor Eddie Kramer, que havia sido sugerido a David Coverdale pelo executivo da Geffen Records A&R, John Kalodner, por causa de seus excelentes trabalhos com o KIss. Mas as coisas dentro da banda não eram as mesmas de antes e simplesmente não houve a química necessária. Kramer enfrentou problemas internos como a insatisfação do guitarrista Micky Moody, que não gostava da proposta de músicas com mais pegada e peso, muito por causa das características do baterista Cozy Powell. No fim das contas kramer acabou sendo substituído pelo homem responsável por vários discos de sucesso do Iron Maiden e Deep Purple, o produtor Martin Birch.
Paralelamente as gravações os problemas espirraram também nas apresentações ao vivo, com David visivelmente descontente com o baixista Colin Hodgkinson e com a performace de palco de Moody. Ao mesmo tempo começava a enxergar no guitarrista John Sykes (Ex-Tygers of Pan Tang) exatamente o que ele imaginava para o futuro do Whitesnake. Sykes estava se apresentado com o Thin Lizzy, que fazia parte da turnê com o Whitesnake. Após a última etapa em Bruxelas, na Bélgica, em outubro de 83, Moody deixou a banda. Logo após a partida do guitarrista, John Sykes foi anunciado à imprensa como o novo integrante do Whitesnake e ao mesmo tempo, foi noticiado que Hodgkinson havia sido demitido e que Neil Murray foi convidado a se juntar a banda.
Após ser lançado no Reino Unido em 30 de janeiro de 1984, “Slide It In” se tornou um sucesso nas paradas, mas foi fortemente criticado pelas letras de duplo sentido. Com dois singles já lançados mesmo antes do LP – “Guilty of Love“/ “Gambler” em 17 de novembro 1983 e “Give Me More Time“/”Need Your Love So Bad” em 3 de janeiro de 1984 – as rádios britânicas apostavam em “Guilty of Love” como maior hit do disco, até por que a faixa já possuía um clipe para divulgação.
Isso tudo logo mudaria, pois a gravadora norte-americana do Whitesnake, a Geffen Records, insistiu que o álbum fosse remixado para se encaixar nos padrões das bandas de heavy metal americanas, que estavam no auge do sucesso comercial. Com o trabalho do produtor Keith Olsen, “Slide It In” teve seu som renovado e soando mais moderno, além de dar a oportunidade para John Sykes e Neil Murray de substituir as partes da guitarra de Moody e do baixo de Hodgkinson, respectivamente. A versão americana de “Slide It In” foi lançada em 16 de abril de 1984.
A turnê de divulgação do trabalho começou em 17 de fevereiro de 1984 no SFX Hall, Dublin, Irlanda, com a banda composta por Coverdale, Sykes, Galley, Murray, Lord e Powell. No setlist de quinze músicas, nada menos do que cinco do novo álbum, que indicava o quanto era alta a aposta nesse disco. Mas alguns problemas ainda viriam pelo caminho. Mel Galley se envolveu em um acidente que danificou alguns nervos em seu braço, tornando-o incapaz de tocar. Ele continuou como membro do Whitesnake por um tempo, mas acabou sendo demitido. Com apenas o jovem Sykes dando conta na guitarra, continuaram em turnê até abril de 1984, quando mais uma mudança na formação aconteceria. Uma possível reunião do Deep Purple era iminente, e Jon Lord se despediu em 16 de abril, após o show no Grand Hotel em Estocolmo, Suécia. Agora o Whitesnake se tornara um quarteto, com a participação do tecladista Richard Bailey, que foi incorporado aos shows, porém sem ser visto pela plateia.
A edição norte-americana de “Slide It In” levou a banda de Coverdale a ter uma popularidade jamais vista antes. O Whitesnake começou a turnê nos Estados Unidos abrindo os shows do Quiet Riot e depois do Dio. A extensa turnê, juntamente com os respectivos singles e clipes para MTV com as músicas “Slow an ‘Easy” e “Love Ain’t No Stranger“, fez o mercado americano abrir os braços para o Whitesnake, algo que continuaria até em maior escala com o álbum “1987” três anos depois.
Hoje é fácil cravar que os dois principais hits do disco são “Slow an ‘Easy” e “Love Ain’t No Stranger“, mas isso só se concretizou graças à versão americana de “Slide It In”, que deu muito mais ênfase a guitarra pesada de Sykes. A edição europeia do álbum possui uma presença mais forte dos teclados de Jon Lord, e o baixo é mais perceptível. A ordem das faixas também é diferente da edição americana.
O álbum acabou vendendo mais de quatro milhões de discos, dois milhões só nos EUA, sendo certificado com duplo disco de platina pela marca obtida. Conseguiu chegar na posição número 40 da parada Billboard 200 e ao nono lugar na lista UK Albums.
A tour de “Slide It In” foi encerrada justamente aqui no Brasil durante a primeira edição do festival Rock in Rio, com shows em 11 e 19 de janeiro de 1985. E é nesse ponto que pegamos o gancho para falar da repercussão desse disco aqui por nossos lados.
A aceitação do publico brasileiro pelo Whitesnake pode ser traduzida em uma única palavra: deslumbre. A mídia não especializada não sabia como lidar com a invasão do heavy metal que o festival, e os FÃS, impuseram a ela. Desde a vinda do Kiss em 1983 não se falava tanto em música pesada no país. Claro, os verdadeiros apreciadores do peso estavam por toda parte como sempre. Comprando seus discos, garimpando informações – Deus abençoe sempre a Rock Brigade por seus serviços prestados – posters, fotos, álbuns de figurinhas, e fitas k7 de seus ídolos. Mas a coisa tomava uma proporção nunca vista antes, com os clipes de metal invadiam os programas como Som Pop, Realce, Super Special e até o Fantastico. As rádios rock, recém-criadas, tinham a concorrência das tradicionais, que programavam músicas como “Love Ain’t No Stranger” em suas rotinas. Revistas posters apareciam aos montes também.
Tem um caso que merece ser destacado. O cigarro Hollywood costumava ser associado em seus anúncios comerciais com pessoas jovens praticando atividades radicais, sempre ao som de uma música ‘rockeira’. Apostando na popularidade do Whitesnake, um jingle para as rádios foi gravado tendo como estrela Coverdade – e o apoio da banda Roupa Nova – cantando um improviso, que terminava com o slogan do cigarro: ‘hollywood, o sucesso’. E realmente o sucesso foi tanto, que pouco depois um compacto foi lançado com uma versão editada de “Love Ain’t No Stranger” e no lado B, a faixa “Slow an ‘Easy“, em uma parceria da gravadora EMI-Odeon com a tabacaria que fabricava o cigarro. Pena que o jingle da campanha na voz de Coverdale não estava presente, mas pode ser encontrado facilmente, tanto que vou deixa-lo entre os links no final da matéria, como de costume.
A versão nacional de “Slide It In” no Brasil é similar à edição europeia, com Moody e Hodgkinson na formação. Era estranho ver o clipe de “Love Ain’t No Stranger” com o som da guitarra de Sykes explodindo pelos autofalantes em comparação com a versão mais burocrática de Moody. Quem possuía o LP e o compacto, conseguia facilmente notar a diferença. Minha bolacha foi comprada em 26 de janeiro de 1985 na loja de Discos Belrus, aqui mesmo em São Caetano do Sul-SP. Eu gostava de comprar lá, pois a cada dez discos comprados, você podia escolher um LP na faixa.
Eu tinha conseguido com um amigo uma cópia da versão americana de “Slide It In” em fita K7, que eu sempre considerei bem superior à versão europeia/brasileira. Mas só sosseguei mesmo em dezembro de 1990, quando comprei o CD original, ainda naquele modelo ‘antifurto’ com o ‘envelopão’, na Woodstock Discos.
David teria ainda muito mais sucesso com o álbum “1987”, mas o divisor de águas é mesmo “Slide It In”. Com esse disco sua passagem pelo Deep Purple ficava definitivamente para trás e Coverdale seria sempre primeiramente associado a sua banda por qualquer pessoa. Sempre foi seu sonho e este clássico o tornou realidade. Portanto, mãos e ouvidos a obra. Esqueça um pouco dos problemas e coloque sua cópia do “Slide It In” pra rolar, com o volume no 11 de preferência. Se não tiver uma, os links estão logo ali no final, como já é de praxe. Até a próxima.
Dados:
Lançamento: 30 de Janeiro de 1984 (Reino Unido); 16 de abril de 1984 (EUA).
Selo:
Geffen/Warner Bros. (EUA e Japão); Liberty (WW) e EMI (Brasil).
Singles:
“Guilty of Love“/”Gambler” em 17 novembro de 1983;
“Give Me More Time“/”Need Your Love So Bad” em 3 de janeiro de 1984;
“Standing in the Shadow“/”All or Nothing” em 26 de março de 1984;
“Love Ain’t No Stranger“/”Guilty of Love” em 12 de abril de 1984;
“Slow an’ Easy” em 29 de abril de 1984.
Certificações:
– Reino Unido, disco de ouro (+100,000);
– EUA, duplo disco de platina (+2.000.000).
Whitesnake:
David Coverdale – vocais
Mel Galley – guitarra
Micky Moody – guitarra
Colin Hodgkinson – baixo
Cozy Powell – bateria
Jon Lord – teclados
John Sykes – guitarra na versão EUA
Neil Murray – baixo na versão EUA
Versão Reino Unido:
Lado A
1.”Gambler“
2.”Slide It In“
3.”Standing in the Shadow“
4.”Give Me More Time“
5.”Love Ain’t No Stranger“
Lado B
1.”Slow an’ Easy“
2.”Spit It Out“
3.”All or Nothing“
4.”Hungry for Love“
5.”Guilty of Love“
Versão EUA:
Lado A
1.”Slide It In“
2.”Slow an’ Easy“
3.”Love Ain’t No Stranger“
4.”All or Nothing“
5.”Gambler“
Lado B
1.”Guilty of Love“
2.”Hungry for Love“
3.”Give Me More Time“
4.”Spit It Out“
5.”Standing in the Shadow“
